Carla Viana - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carla Viana
Carla Viana
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Carla Viana é licenciada em Linguística e mestranda em Linguística Computacional pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

 

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Na frase «Mandei-os sair», o verbo sair está no infinitivo pessoal, ou impessoal?

Resposta:

O verbo sair está no infinitivo impessoal.

O verbo mandar na frase «Mandei-os sair» é um verbo transitivo e também causativo. De acordo com Mateus et al. (Gramática da Língua Portuguesa, 2003, pág. 642), os verbos causativos podem admitir completivas não finitas de infinitivo flexionado, conforme o exemplo «Mandei os alunos saírem da sala» e também a construção de marcação de caso excepcional, «Mandei os alunos sair da sala».

No caso da construção de marcação de caso excepcional, os verbos causativos, como mandar, seleccionam orações completivas, conforme:

«O professor mandou o aluno responder à questão.»

Na construção acima, o verbo da oração completiva ocorre no infinitivo não flexionado (tradicionalmente impessoal), uma vez que o sujeito da completiva ocorre em acusativo, como mostra o uso do pronome pessoal átono correspondente:

«O professor mandou-o responder à questão.»

Pergunta:

Com quatro gramáticas, duas das quais de 2009, obtenho subclasses diferentes do nome, mas o que me interessa saber mais especificamente é se os nomes colectivos passam a constituir-se como subclasses dos comuns, passando a designar-se nomes comuns colectivos (como está numa gramática de 2009, da Areal Editores), ou não, uma vez que as outras não dão essa indicação, classificando-os apenas como nomes colectivos e como subclasse do nome.

Grata pela atenção!

Resposta:

Em Portugal, de acordo com o Dicionário Terminológico do Ministério da Educação, os nomes colectivos são uma subclasse do nome comum, podendo ser contáveis e não contáveis:

[Nome colectivo é um] nome que se aplica a um conjunto de objectos ou entidades do mesmo tipo (i). Há nomes colectivos contáveis, como os exemplificados em (i), e nomes colectivos não contáveis, que não aceitam plural, como os exemplificados em (ii). [...]

(i) rebanho, alcateia, multidão
(ii) fauna, flora [...]


Como termo gramatical, ocorre simplesmente como nome colectivo, não sendo necessário usar a expressão «nome comum colectivo».

 

Pergunta:

As frases abaixo se apresentam na voz ativa ou passiva?

1) «Há estudos feitos em ambiente natural...»

2) «... o que nos é contado pelo biólogo Salten...»

Resposta:

As duas frases são frases passivas. Passemos então à sua análise:

1) «Há estudos feitos em ambiente natural...»

Esta é uma estrutura oracional reduzida, ou seja, estrutura passiva em que não há qualquer verbo flexionado que acompanhe a forma de particípio passado. Estas estruturas oracionais reduzidas ocorrem tipicamente como modificadores ou apostos de expressões nominais, neste caso do nome estudos, tendo portanto uma função e uma distribuição semelhantes às das orações relativas. Veja-se que é possível substituir a estrutura oracional reduzida de 1) por uma oração relativa restritiva com forma passiva e de estrutura oracional plena, isto é, com presença do verbo auxiliar da passiva:

«Há estudos que foram feitos em ambiente natural pelo biólogo Salten.»

2) «... o que nos é contado pelo biólogo Salten...»

Esta é uma estrutura passiva do tipo participial, mais concretamente uma estrutura oracional plena, com o verbo auxiliar ser que se caracteriza pelo facto de o predicador verbal ser um particípio passado. É uma estrutura oracional plena em que existe uma forma flexionada do verbo ser (é). Neste tipo de ocorrência o verbo ser é designado como auxiliar da passiva.

Pergunta:

Quais os elementos mórficos das palavras revalorizar e repartir?

Resposta:

Os elementos mórficos de uma palavra ou morfemas são unidades mínimas de significado. Estes podem ser radicais, temas, palavras ou afixos. Assim, nas palavras revalorizar e repartir, temos os seguintes morfemas:

[[re] prefixo [[[valor] nome [iz [a] vogal temática] tema verbal r] sufixo verbal] verbo] verbo

[[re] prefixo [[[part] radical verbal [[i] vogal temática] tema verbal r] sufixo verbal] verbo]verbo.

Pergunta:

Gostaria de saber qual a transitividade do verbo acreditar e do verbo esquecer e também porque está errada a seguinte frase:

«Acredita-se serem possíveis que as atividades laborais do mercado informal possam, num certo momento, propiciar a transição para o emprego assalariado formal.»

Resposta:

De acordo com o Dicionário Houaiss, o verbo esquecer pode ser um verbo transitivo directo conjugado pronominalmente («O João esqueceu-se do exame»), um verbo bitransitivo («Esqueceu o livro em casa»)1 ou um verbo transitivo e intransitivo [«Ele bebe para esquecer (o que aconteceu)»].

Quanto ao verbo acreditar, pode seleccionar:

a) um complemento oblíquo:

«Acredito nas tuas palavras.»

b) uma oração completiva finita ou não finita:

«Acredito que é possível vender a casa numa semana.»

«Acredito ser possível vender a casa numa semana.»

A frase que o consulente indica está incorrecta gramaticalmente uma vez que a expressão «É possível» deve manter-se no singular (infinitivo pessoal), pois concorda com o seu sujeito, a oração completiva «que as actividades laborais do mercado informal possam, num certo momento, propiciar a transição para o emprego assalariado formal»:

«Acredita-se ser possível que as atividades laborais do mercado informal possam, num certo momento, propiciar a transição para o emprego assalariado formal.»

Ou seja:

«Acredita-se ser possível isso.»

1 Na terminologia usada pelo Dicionário Houaiss, consideram-se objectos indirectos os constituintes introduzidos por preposição que são seleccionados pelo verbo.