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1. Em Portugal, discute-se o programa do novo governo – XXIV Governo Constitucional – saído das eleições legislativas de 10 de março. Programa é, portanto, palavra recorrente na comunicação social portuguesa, muito presente no contexto político e noutros âmbitos («programa de rádio», «programa de televisão», «programa de computador»), mas cuja história merece um breve comentário. Refira-se, portanto, que o vocábulo programa está atestado, pelo menos, desde 1789, no conhecido dicionário de Morais, com a seguinte definição (mantém-se a ortografia e pontuação originais): «escrito, que se affixa, ou publica para convidar a fazer alguma coisa, v. g. os que publicão as Academias para se dissertar sobre alguma materia, resolver algum problema &c.» Programa não alterou substantivamente a sua significação e, continuando a aludir a uma atuação pública, pode hoje ser sinónimo de projeto e plano. Terá sido introduzido no idioma provavelmente pelo francês programme, forma com registos desde finais do século XVII (cf. Dicionário Houaiss). Este termo é afrancesamento do latim tardio programma, programmătis, que significa «publicação por escrito, edital, cartaz»; e este, por sua vez, é adaptação do grego prógramma, prográmmatos, «ordem do dia, inscrição», um derivado do verbo prográphō, formado por pró- («diante de») e gráphō, «escrever, inscrever»,  e que tem as aceções de «escrever anteriormente, descrever publicamente» (cf. ibidem). Programa faz parte, portanto, do léxico de cunho internacional, visto encontrar formas semelhantes, com a mesma origem e com o mesmo radical (cognatas) em espanhol, francês, italiano, inglês, alemão e muitas outras.

Na imagem, o programa de um recital de poesia que teve lugar em 1963, na Sociedade Nacional de Belas Artes (Lisboa).

2. Revolução e revolta serão sinónimos? Em O Nosso Idioma, num apontamento escrito a pensar nas comemorações dos 50 anos do 25 de Abril de 1974, a consultora Inês Gama analisa as subtis diferenças semânticas entre estas duas palavras. Ainda na mesma rubrica:

–  Sara Mourato explora a origem e o significado do neologismo pele-limpa, surgido em referência a questões de defesa e espionagem;

– e, transcrito com devida vénia do mural Língua e Tradição (Facebook, 29/03/2024), disponibiliza-se um apontamento do linguista Jefferson Evaristo sobre o excesso de que, induzido pela recorrência da locução «é que» entre os falantes do Brasil (e certamente dos outros países de língua portuguesa).

3. A forma «copia-lo» está correta? Não deveria ser «copia-o»? A dúvida faz parte do conjunto de seis questões que constitui a atualização do Consultório. Outros tópicos são abordados: a explicação da próclise na frase «na tua irreverência se vê a tua singularidade»; a expressão «mais e mais»; o nome muçum; o feminino de piloto; e o termo translocação.

4. À volta de fraseologia pitoresca, estrangeirismos, curiosidades linguísticas e neologismos, são de realçar:

– No jornal Público, as crónicas que o escritor Miguel Esteves Cardoso tem dedicado a certas fraseologias do português falado em Portugal, como «e já vai com sorte...» e «não digas que vais daqui...», sendo também de mencionar «Enough said, Mr Mamede», sobre o uso anglicista de quão e suficiente.

– No podcast Pilha de Livros, o professor universitário Marco Neves prossegue no seu trabalho de divulgação linguística, destacando-se os episódios dedicados à origem de OK (episódio 222); à palavra pirilampo, com uma evocação de Bluteau (episódio 223); à diferença entre língua e dialeto, a propósito do quimbundo, uma importante língua nacional de Angola (episódio 224); e ao suaíli, língua possuidora de sistema peculiar de representação das horas (episódio 225).

– No Diário dos Açores, o neologismo trumpinoma é o mote de um artigo do médico, político e empresário António Simas Santos, que o apresenta como «termo que, de uma forma criativa, descreve a malignidade ou impacto negativo que muitos sectores, americanos e internacionais, associam à figura de Donald Trump» (mantém-se a ortografia original).

5. Uma chamada de atenção para uma publicação académica que, embora já conte com dois anos de publicação, mantém toda a atualidade: trata-se de Descrição Linguística , Educação e Cultura em Contextos Pós-Coloniais, um livro em PDF organizado pelos linguistas Ezra Alberto Chambal Nhampoca, David Alberto Seth Langa e Alexandre António Timbane.

6. Iniciativas e eventos com interesse linguístico:

– em 11 de abril, em Miranda do Douro, a realização do 3.º Encontro de Línguas Minoritárias (OWL+), promovido pela União Europeia;

– a intenção do novo governo português de retomar a proposta de a língua portuguesa se tornar língua oficial na ONU;

– a disponibilização em formato digital do arquivo da Academia das Ciências de Lisboa, fundada em 1779.

7. Quanto aos temas de três dos programas que a rádio pública de Portugal dedica à língua portuguesa, salientam-se:

– No programa Língua de Todos, difundido na RDP África, na sexta-feira, 12/04/2024 às 13h20* (repetido no dia seguinte, c. 09h05*), a linguista Sandra Duarte Tavares fala sobre a didática necessária ao desenvolvimento da competência linguística dos alunos.

– O analfabetismo em Portugal é o tema de uma entrevista à professora e investigadora Carmen Cavaco (Instituto de Educação da Universidade de Lisboa), transmitida em Páginas de Português (Antena 2, domingo, 14/04/2024, 12h30*; repetido em 20/04/2024, 15h30*). O programa inclui um apontamento gramatical da professora Carla Marques, acerca da palavra tal.

– Igualmente na Antena 2, refira-se ainda Palavras Cruzadas, programa realizado por Dalila Carvalho, de segunda a sexta, às 09h50* e às 18h50*.

*Hora oficial de Portugal continental.

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